O conceito de samsara, a eterna roda da vida e da morte como
descrita pelos hinduístas e budistas chegou a nós, ocidentais com toda força na
segunda metade do século 20. Mas, a rigor, esse pensamento já havia
estado entre nós quando foram difundidos os arcanos do Tarot, especialmente com
a carta A Roda da Fortuna.
A carta, no Tarot de Marselha, um dos mais conhecidos,
mostra uma roda onde giram três criaturas. Duas estão juntas à roda
e, quando uma sobe, a outra desce. A terceira está numa plataforma e usa
uma coroa e uma espada que, apesar disso, só demonstram “o fenômeno passageiro
do domínio.”
O samsara, no orientalismo, é o fluxo incessante dos
renascimentos através dos mundos. Assume conotação negativa, como uma
condição a ser superada. Relaciona-se, portanto, com a ideia de
reencarnação. Mas é necessário mesmo acreditar na reencarnação para
analisar ou vivenciar a superação do samsara?
Não se pode separar a doutrina da reencarnação da lei do
karma; isso é verdadeiro. O budismo detalha os chamados elos de
originação dependente, conhecidos como nidanas, que relacionam-se com as causas
e efeitos, envolvendo desejos, consciência, hábitos e tendências. Para os
hindus também essa ligação entre reencarnação e karma é fundamental.
Sendo o esquecimento das vidas explicada pelo fato de que a mente consciente se
rege pelas tendências resultantes da memória e não pela própria memória.
Mas a ideia de evolucionismo, de que cada reencarnação
próxima poderia ser melhor do que a anterior só foi incluída no pensamento
espiritualista através da codificação da doutrina espírita de Allan Kardec no
final do século XIX. A concepção evolucionista não existia na Antiguidade
oriental.
A roda do samsara equivale a uma seqüência infinita de causa
e efeito, na qual somos o sonho de alguém enquanto sonhamos um
outro. Não há um eu permanente, todos os “eus” são transitórios que
subsistem e sobrevivem num outro eu, tão ilusório quanto o primeiro.
Alguém viu alguma semelhança com os enredos de filmes hollywodianos como A
Origem ou Matrix?
Entendida como metáfora psicológica, a roda do samsara pode
significar a seqüência de despertares de consciência que um indivíduo tem ao
longo da vida. Morrendo (deixando-se submergir na inconsciência) e
renascendo (tendo consciência plena da sua vida).
O psicanalista C. G. Jung em seu primeiro trabalho, tentou
mostrar que “os espíritos” que uma médium incorporava eram diferentes facetas
da personalidade da mesma e, assim, eram manifestações do inconsciente pessoal
dela. Não quero com isso, criar um conflito com o espiritismo nem com
seus adeptos, muitos deles, meus amigos. Apenas desejo chegar ao ponto de
que não é preciso ser espírita (ou budista, ou jainista, ou hinduísta) para pôr
em prática o conceito da roda de samsara.
Existe a possibilidade de que uma memória coletiva seja
transmitida geneticamente, o que nos levaria a pensar e sentir como se a
memória de outra pessoa fosse uma outra existência nossa no passado e, às
vezes, até no futuro, como certas viagens astrais demonstram com experimentos
xamânicos, por exemplo.
Longe de esgotar o assunto, pretendo, tão somente, trazê-lo
de volta à baila para que possa ser amplamente discutido. A roda do
samsara, a ilusão da vida, das muitas vidas numa só vida pode e deve ser
pesquisada e analisada nos diversos aspectos que compõe a nossa realidade.
Ou a ilusão de realidade. Afinal, segundo Parmênides, podemos dizer que
os pensamentos são coisas. E se isso é verdade, as coisas são
pensamentos.
A física no fundo é uma psicologia porque descreve uma
realidade que é, antes de tudo, mental e psíquica. O experimentador fazendo
parte do sistema experimental como na física quântica. Resta viver a
ilusão ou superá-la se formos capazes. Paz e luz.
(Mauricio Duarte)
TFA/SFU
Ir Daniel Martina Toupitzen.'.
(Ilustração e Pesquisa)